Gazeta Mercantil Balanço Tocantins Jun 1998
Com um rebanho bovino de 6,5 milhões de animais, Tocantins tem o maior plantel de gado de corte do Norte do País. Graças a gente como o mineiro Epaminondas de Andrade. Ele viu que o calor, a luminosidade e umidade fazem o capim crescer mais rápido; por isso o boi ganha peso também mais rapidamente. Ele fez de sua fazenda, Vale do Boi, um modelo de eficiência. Tudo controlado por computador.
São 160 piquetes de pastos numerados e mapeados, 250 km de cercas conservadas no mesmo padrão, mais de 300 porteiras, 40 km de estradas cascalhadas e um plantel de gado Nelore que oscila entre 7 mil e 8 mil cabeças. Esse mundo verde, pontilhado pelo branco do gado, chama-se Fazenda Vale do Boi e fica no novo município tocantinense de Carmolândia, região de Araguaína, a aproximadamente 400 km de Palmas. Quase nada disso existia em 1983, quando Epaminondas de Andrade, mineiro de Uberaba, então superintendente da casa de móveis Gelli, no Rio de Janeiro, comprou a fazenda em sociedade com amigos.
Quando soube que o imóvel estava à venda, assustou-se inicialmente com os 2 mil km de distância do Rio. Mas gostou do lugar à primeira vista. Há dez anos Andrade mora na Vale do Boi – hoje marcante referência para a pecuária nacional – com a esposa Walkyria e os filhos Ricardo José e Paulo Henrique. Dedica-se exclusivamente ao empreendimento; seu sócio principal, Renato de Carvalho Gelli, da Casa Gelli, continua no Rio e vai poucas vezes à fazenda. “Sou o homem do campo e ele é homem da cidade”, diz Andrade.
Sem ter um serviço especial de limpeza, a Vale do Boi, com 7 mil há, mais parece um imenso jardim, sem sombra de lixo, da sede às divisas. Os pastos, que ocupam 5 mil há, são formados com grande variedade de capins. Tal variedade facilita o controle de pragas, como a cigarrinha, e garante alimento constante para o gado. É tanto capim que Andrade, interessado em melhorar o nível da pecuária regional, dá simplesmente mudas para fazendeiros que o procuram.
Não é pouca coisa: no ano passado, 50 caminhões de mudas saíram da fazenda. E neste ano, somente um vizinho levou duas carretas cheias. Mas a grande contribuição da Vale do Boi para o desenvolvimento da pecuária está no seu trabalho de seleção e reprodução de Nelore. Pioneira em inseminação artificial na região de Araguaína, a fazenda, com 1.500 matrizes, utiliza software de seleção fiscalizado pela Associação Brasileira dos Criadores de Zebú (ABCZ) e vende cerca de 200 touros por ano, oferta que tende a aumentar.
Como o mercado regional, com poucos selecionadores de gado, valoriza apenas animais machos. Andrade prefere conservar as fêmeas na própria fazenda para aumentar o plantel de matrizes. O controle é rigoroso: fêmea que não emprenha até dois anos e meio ou que não atinge 300 kg de peso até dois anos é descartada.
Para o plantel destinado a abate, a Vale do Boi tem critérios próprios de seleção. Andrade compra cerca de 2 mil bezerros por ano, mas o aumento projetado do número de matrizes poderá dispensar essas compras. A preferência é por animais na faixa de 200 kg que, ao chegaram à fazenda, são pesados e tomam vermífugos. Uma semana depois, descansados e adaptados ao novo ambiente, são vacinados contra manqueira e aftosa. Daí para a frente, é pastar, crescer e ganhar peso. Todo ano, a fazenda vende, além de reprodutores, 1.800 bois para abate, com peso médio de 17 arrobas. Seu mercado está na áreas do Nordeste e do Norte, regiões que dão preferência à carne de Nelore por ter só gordura externa e rendimento maior de traseiro.
A Vale do Boi optou pelo Nelore por vários motivos, incluindo experiências anteriores de Andrade com a raça em fazendas no Cento-Oeste e a facilidade de desenvolvimento em clima quente e úmido como o Tocantins. Por isso o empresário vê na pecuária de corte a grande vocação da região: o calor, a luminosidade e a umidade fazem com que o capim e o boi cresçam mais, comparativamente ao Cento-Oeste, que hoje troca a pecuária pela produção de grãos. Sem falar no preço da terra, mais baixo no Tocantins, que registra ainda pouca presença de carrapatos e a quase inexistência de bernes.
Muita coisa mudou, em pouco tempo, na Vale do Boi. Além de utilizar com bom retorno recursos de informática, inclusive para comunicação externa, a fazenda, que só trabalha com dinheiro próprio e tem gasto mensal da ordem de R$ 50 mil, conta hoje com dois troncos de linhas telefônicas e eficientes sistemas de fornecimento de água e energia.