Fazenda-Modelo troca de dono

Gazeta Mercantil Balanço Tocantins Set 2001

O pioneiro Epaminondas de Andrade vendeu sua fazenda Vale do Boi, em Carmolândia, na região de Araguaína, a 396 km da capital Palmas. Até outubro estará concluído o processo de transferência dos 8 mil hectares da propriedade.

Há três anos, o sócio investidor principal, Renato de Carvalho Gelli, comunicou a Epaminondas que não pretendia continuar no negócio do boi. Gelli é proprietário da rede de lojas de mobiliário que leva seu nome no Rio de Janeiro e tem uma única herdeira, que não se interessa pela pecuária.

A partir daí, mais de dez contatos com potenciais compradores, alguns deles os maiores criadores de gado do Estado, foram realizados. Ao final das negociações, 92,8% do território da fazenda – que, além da sede, tem oito casas de empregados, galpão de máquinas, escritório, estrebaria e três retiros (área de manejo de gado) – foram comprados por Leonardo José dos Santos, produtor de Araguaína.

Nos últimos 18 anos, a vida de Epaminondas, 70 anos, mineiro de Uberaba, foi toda ela dedicada a edificar a Vale do Boi. Construiu as estruturas que diferenciaram a propriedade do restante do padrão tocantinense e difundiu seu nome aos quatro ventos, levando-a a ser considerada modelo em toda a região pela alta linhagem dos animais e tecnologia de ponta utilizada na cria e engorda do rebanho.

Epaminondas montou uma fazenda com 5 mil hectares de pastagens, com grande variedade de capins (colonhão, tanzânia, mombaça, brachiarão, grama estrela e outros), dotada de 250 km de cercas e 20 km de corredores, que dividem a área de pastagem em 170 pastos com aguada (manancial próprio). Somente em estradas internas, a Vale do Boi tem 30 km. Além de contar com uma pista de pouso não pavimentada de 1 km.

Em 2000, o faturamento da fazenda foi de R$ 1,2 milhão. Metade veio da venda de parte do rebanho de corte, de propriedade de Gelli. A outra parte foi fruto da ria de nelores PO (puros de origem), efeituada por Epaminondas. Segundo ele, este ano o faturamento da fazenda irá para as alturas, mais isso decorre do processo de liquidação. “A pessoa jurídica deixará de existir, vou manter apenas a marca, administrando-a como pessoa física mesmo.”

O prazo para Epaminondas desocupar as terras recém-vendidas vai até novembro. Para ele, a mulher, dona Walkyria, dois filhos, duas noras e dois netos, o momento agora é de recomeço. É hora de construir uma nova estrutura nos retiros Nova Era, remanescente da área da Vale do Boi, construir e reformar espaços nos mil hectares da fazenda São Caetano.

Para retomar o patamar de qualidade atual de produção na área construída ao longo destes 18 anos, Epaminondas prevê aplicar R$ 1 milhão, em cindo anos, na nova propriedade. O nome para junção das áreas ainda não foi definido, mais é certo que ele continue administrando a marca Vale do Boi.

O desafio de mercado que a família enfrentará será manter o vigor da marca paralelamente ao trabalho de dotação de infra-estrutura dos 500 hectares remanescentes da fazenda original, onde está o retiro Nova Era e na área da São Caetano. As duas porções de terra estão separadas e margeiam a rodovia estadual TO-164 pelos dois lados. “Neste negócio surgiram duas vantagens: ganhei uma vitrine invejável e ficarei uns 10 km mais perto de Araguaína”, declara Epaminondas.

Ícone do Boi Verde

Gazeta Mercantil Balanço Tocantins Set 2001

Tradicionais fazendeiros viram executivos da pecuária. Caso de Epaminondas de Andrade, 70 anos, pioneiro no melhoramento genético do rabanho nelore e correção de solos para pastagens. Ele acaba de vender a célebre fazenda Vale do Boi, mas a marca fica com a família.

O que muda no negócio do boi

Entra a tecnologia de ponta e atrás dela chegam as modernas técnicas de administração

A adoção de tecnologias modernas – como a seleção genética e a reprodução assistida – está mudando a cara da pecuária tocantinense. Nessa metamorfose, o negócio da criação de gado, como um todo, também se atualiza via adoção de técnicas administrativas voltadas para a qualidade total. Os fazendeiros de antes são chamados agora de executivos pecuaristas, responsáveis, em parte, pelo atual estouro da “boiada verde”.

De fato, o rebanho estadual de bois criados a pasto, o chamado “boi verde”, está aumentando à razão de 600 mil cabeças por ano. O crescimento em 2001 é equivalente a 10.7%, se comparado com o mesmo período do ano passado. O outro fator responsável pela expansão, porém, é a perspectiva de ganhar o mercado externo.

Ainda que a recente conquista do certificado da Organização Internacional de Epizootias (OIE), de área livre de febre aftosa com vacinação, não tenha aberto automaticamente as portas para o mundo, serviu de motivação para a melhoria na qualidade do rebanho. E representou um grande alento para a indústria frigorífica.

Um caso ilustrativo das novas tendências é o do criador Epaminondas de Andrade, de 70 anos, um genuíno executivo da pecuária. Há 18 anos e meio na fazenda Vale do Boi, em Carmolândia, na região de Araguaína, ele é o pioneiro na adoção de práticas de melhoramento genético, inseminação artificial, correção de solos para pastagens e controle informatizado de todos os procedimentos das propriedades. “Com mais cindo a sete anos, Tocantins vai assumir a primeira posição na pecuária de corte do País”, diz.

Andrade cita um conjunto de fatores – condições de clima, solos, expansão da fronteira agrícola e preço da terra – como elementos indutores da melhoria de qualidade na pecuária de corte. Ele lembra que os Estados do Sudeste – ao contrário de Tocantins – estão em fase de redução do plantel, e as terras migram para a pecuária leiteira e agricultura. “Um quilo de soja tem produção mais barata do que um quilo de carne, e ambos são commodities, com a diferença que a soja é mais fácil de transportar a longas distâncias.”

Segundo ele, as terras caras do Tocantins estão cotadas a R$ 1,5 mil o hectare, justamente na região de pecuária de corte mais desenvolvida. “Soma-se a esse preço compensador o menor custo de aprendizagem do pecuarista tocantinense, que hoje tem acesso a quase toda a base de tecnologia do campo, tanto em produtos como em procedimentos.”

A última prova de ganho de peso a pasto, realizada na Vale do Boi, confirma que as expectativas de Andrade não são infundadas. Na ocasião, pecuaristas de diversas localidades do Estado deixaram seus animais, de diferentes linhagens, alimentando-se em condições idênticas e o ganho médio diário de peso nos bois foi de 850g. Ele esclarece, contudo, que o desempenho não é uma decorrência pura e simples da genética apurada, mas sobretudo das boas condições ambientais e da qualidade do pasto. “Conseguimos chegar a resultados idênticos ao dos criadores de bois em confinamento, com até 1 kg de ganho diário em alguns animais, e sabemos que com mais tecnologia e nutrição adequada isto pode melhorar mais ainda”, anima-se Andrade.